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Sucesso passado não garante futuro

  • Writer: Clilson Filippetti
    Clilson Filippetti
  • 3 days ago
  • 5 min read

Artigo escrito para a Revista Mercattoria, edição maio de 2025



Os últimos dez anos deixaram marcas profundas no varejo global. Do Brasil aos Estados Unidos, o setor foi colocado à prova por transformações tecnológicas aceleradas, instabilidades econômicas e uma pandemia sem precedentes. Foi um verdadeiro teste de resiliência — e nem todos passaram ilesos.


Apesar disso, há sinais positivos no horizonte. Segundo a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), o varejo nacional cresceu 4,7% em 2024, o maior índice desde 2012. Um número que anima, mas que não conta toda a história. Afinal, o caminho até aqui foi tudo, menos linear.


Neste artigo, convido você, leitor que me acompanha mensalmente, a refletir sobre essa volatilidade com base em dados recentes e vivências do setor. Para provocar nosso olhar estratégico, trago dois cases emblemáticos dos Estados Unidos: empresas consolidadas que erraram o timing ou subestimaram os sinais do mercado — e acabaram tropeçando. Porque, sim, até na terra do Tio Sam os tombos acontecem.


Aliás, os números falam por si. De acordo com a Times Brasil, publicada em janeiro, o fechamento de lojas nos EUA disparou em 2024, com previsão de atingir cerca de 15 mil unidades encerradas até o fim do ano. Redes como Big Lots e The Container Store — sobre a qual falarei mais adiante — estão em retração e até enfrentando pedidos de falência. Em contrapartida, um estudo da consultoria Coresight Research aponta quase 6 mil novas inaugurações no mesmo período, o maior volume desde 2012. Enquanto isso, gigantes como Walmart, Amazon e Costco seguem firmes, ganhando mercado. Um contraste que exige atenção redobrada — e uma leitura mais estratégica dos sinais do varejo.


Um mundo mais rápido, exigente e imprevisível


O varejo atual é regido por um ritmo acelerado, ditado por novas tecnologias e mudanças abruptas nos padrões de consumo. Pontos bem conhecidos por todos reforçam esse cenário:


·  A inteligência artificial permite ofertas personalizadas, precificação dinâmica e atendimento segmentado.

·  A automação está presente do abastecimento à logística, passando pela gestão de crédito, RH e até promoções.

·  A incerteza econômica influencia diretamente o comportamento do consumidor, pressionando cadeias de suprimentos.

·  Crescimento de 4% nas vendas de fim de ano, totalizando aproximadamente R$ 5,25 trilhões  entre 1º de novembro e 31 de dezembro, segundo a National Retail Federation.


Contudo, gastos concentrados em poucos varejistas como as chinesas de comércio eletrônico Shein e Temu que arrecadaram juntas cerca de R$ 600 bilhões, com a maioria das vendas vindo de fora dos EUA.


Os impactos globais e o efeito dominó no consumo


O cenário global atual, recheado de incertezas geopolíticas e econômicas, afeta o varejo diretamente:


·  A “Trumponomics” com aumento de taxas de importação, controle da imigração ilegal e fortalecimento do dólar, podendo elevar a inflação e reduzir o consumo interno.

·   Tensões na Ucrânia, no Oriente Médio e a desaceleração da China afetam a confiança e o fluxo logístico global.

·   Estratégias como “Just in Case” e “Nearshoring” substituem o antigo “Just in Time”.

·   A inflação e o dólar forte pressionam o orçamento das famílias, especialmente no consumo de alimentos.


Cases selecionados


Case 1: ABC Carpet & Home – A tradição que não acompanhou a disrupção

Visitei mais de 100 pontos de venda em Nova York como preparação para a NRF 2025. A ABC Carpet & Home foi um dos que me chamaram atenção pelo contraste entre sua história gloriosa e a atual realidade.

Fundada no século XIX, a ABC Carpet & Home se tornou referência mundial em tapetes e decoração. Instalada em um prédio icônico de quatro andares, seu conceito combinava luxo, exclusividade e experiências sensoriais, com um restaurante no subsolo e produtos únicos.


Porém, a empresa ignorou sinais claros: demorou a investir no digital, manteve uma operação pesada e foi surpreendida pela pandemia com uma estrutura analógica e inflexível. Em 2021, entrou em falência.

Comprada por um fundo, passou a ser liderada por Aaron Rose, que iniciou um plano ousado de recuperação:


·   Redução física: de quatro para dois andares, com foco em categorias estratégicas.

·   Transformação digital: um novo e robusto e-commerce com 40 mil SKUs.

·   Atendimento humano no digital: videochamadas com designers para clientes.

·   Retenção de equipe: 80% da equipe original foi mantida, garantindo consistência no atendimento.

Um case de reinvenção tardia, mas com lições valiosas.

 

Case 2: The Container Store – O perigo de envelhecer sem inovação


A The Container Store  foi outro case, com mais de 45 anos de história, nasceu com uma proposta inovadora: oferecer soluções de organização para o lar. Após abrir capital em 2013, traçou planos ambiciosos de expansão, projetando alcançar 300 unidades. No entanto, mais de uma década depois, a rede conta com pouco mais de 100 lojas e enfrenta uma grave crise.


Na visita que fiz à unidade da 6ª Avenida, em Nova York, o cenário falava por si. Um ambiente frio, sem experiência marcante, sem diferenciação. Um varejo que parece ter parado no tempo.


O atual CEO, Satish Malhotra, anunciou recentemente que a empresa entrou com pedido de reorganização financeira, com a promessa de "emergir mais forte". No entanto, a perda de relevância já se acumulava há anos — reflexo de uma presença digital tímida, pouca inovação no ponto de venda e uma proposta de valor cada vez menos sedutora para o consumidor moderno.


Reflexões e aprendizados para o varejo brasileiro


Tanto a ABC Carpet quanto a The Container Store falharam ao não antecipar mudanças no comportamento do consumidor e não adaptar sua estrutura à nova realidade. Isso me faz lembrar de algo que repito com frequência nas empresas que atendo como conselheiro:

"O sucesso passado é apenas um capítulo. Longevidade depende de leitura constante do presente."


Com mais de 30 anos de experiência no varejo, especialmente em empresas de pequeno e médio porte, identifiquei padrões recorrentes nas organizações que buscam meu apoio como consultor ou conselheiro. Antes de qualquer proposta, aplico um diagnóstico detalhado — e é nesse processo que alguns desafios aparecem com frequência:


1. Falta de planejamento estratégicoMuitas empresas não têm uma visão ampla do mercado em que atuam. Ignoram mudanças no perfil do consumidor, novos concorrentes e a necessidade de entregar experiências, agilidade e propósito.


2. Falhas na execuçãoSem um planejamento bem definido, é difícil cobrar resultados. Isso gera repasses de culpa dentro da equipe e dificulta a identificação de bons profissionais. “Quando há metas claras, a execução exige alinhamento, comunicação eficiente, acompanhamento diário, ajustes rápidos e celebração de conquistas”.


3. Pessoas certas nos lugares certosO crescimento sustentável depende de talentos competentes. Em empresas familiares, é comum herdeiros, familiares ou amigos próximos assumirem posições sem preparo, o que pode travar o avanço do negócio.


4. Conflitos societáriosBrigas entre sócios e herdeiros, normalmente por dinheiro ou poder, são frequentes. É essencial separar os papéis entre Propriedade, Negócio e Família para garantir a governança e a saúde da empresa.


E aí, fecho com uma provocação: se até empresas centenárias perdem relevância por falta de adaptação, O que estamos fazendo hoje para garantir o futuro do nosso negócio?


Forte abraço e até o próximo artigo!


 

 
 
 

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